segunda-feira, 19 de março de 2018
a preto e branco
A madrugada nascia lentamente...a aldeia ainda não acordara. As chaminés permaneciam adormecidas e teimavam em lançar os seus braços fumegantes que haveriam de abraçar os céus.
O nevão caído de véspera deixava antever um passeio gelado...mas a expectativa dos cenários criados pela neve aquecia mente e corpo...as vestes modernas fariam o resto.
O cenário que se percorria...em passo lento de contemplação...era um misto de paraíso com tragédia...o pensamento começava a ganhar forma e os sentidos iam-se desligando.
A neve cria sempre um espectáculo de contrastes...o branco imaculado faz sobressair ainda mais os tons...tudo...no "choque" com a neve...é mais do que na verdade é.
Mas aqui...neste local que tem a geografia como aliada para o tornar mágico...para além de algumas casas...cujas pinturas escaparam à "normalidade"...o preto é o contraste maior...o preto que o Verão passado deixou como tinta primordial.
A floresta foi transformada numa mata retalhada...morta...sem vida...de árvores consumidas pelas chamas...mas que teimam em permanecer de pé...pintadas a preto.
No ar há um odor intenso a queimado que...apesar de maltratar os pulmões e se sentir a cada respiração...destroça a alma. Ao mesmo tempo lança os nossos pensamentos...sem controlo algum e sem possibilidade de freio...a imaginar como terão sido...aqui...vividas as horas...os dias...com as chamas literalmente à porta...sem lugar a balanços prévios de percas materiais...apenas a luta pela mais básica sobrevivência.
É uma paisagem triste...apesar de minorado o impacto pela existência de neve...tão ao agrado dos forasteiros...que não têm de lidar com os seus constrangimentos.
A neve aplicou...de forma quase directa...um filtro natural B&W...não havendo necessidade de recorrer à saturação das cores para o criar...ele está ali...diante dos nossos olhos.
A natureza...na sua fabulosa capacidade regenerativa...tentará mudar o filtro...mas será sempre o Homem a determinar a palete final de cores...infelizmente.
quarta-feira, 14 de março de 2018
O centro do mundo...era aqui...
São crianças...na rua...a fazerem aquilo que é suposto fazerem...brincarem...livremente...sem medo.
Estas não trazem gadgets ou equipamentos castradores da sua liberdade...não que os não tenham...não conheço a sua condição social...mas sinto...pelo som do "um-dó-li-tá" e dos seus sorrisos...que são...neste momento...livres das criações dos adultos que sonham sempre em encarcerá-las...seja de que forma for.
O que me corrói por dentro...qual ácido a deslizar suavemente pelas minhas veias...é pensar que estas crianças são...no exacto momento em que primo o botão do obturador...abençoadas pela sorte...são a excepção...são mesmo uma minoria.
Os seus direitos...consagrado numa carta bafienta e sem sentido prático...escrita por adultos...são na realidade a prova de que estas crianças são uma miragem...num mundo cada vez mais insuportável...
Perguntas em catadupa caiem com estrondo na minha cabeça...como é possível alguém roubar-lhes a inocência? Como é possível estas crianças serem uma excepção? Como é possível escravizar crianças? Como é possível transformá-las em objectos de rentabilidade laboral? Como é possível despejar-lhes bombas em cima? Como é possível dispor delas, na exacta medida em que se dispõe de um bem utilitário...sem valor? Como é possível retirar-lhes o sorriso...porque não têm sequer o direito a sorrir? Como é possível matá-las...conscientemente?
COMO É POSSÍVEL?
Mas se o estrondo das perguntas causa moça...o rasgo é letal quando sinto que todos os pontos de exclamação o não são...eles são pontos finais...não são nenhuma pergunta...são factos concretos.
Respirar a nossa própria impotência só é suportável ante o egoísmo sentido de nos darmos ao luxo de sofrer pelo que vemos...a muitas das crianças do mundo já tirámos nós a simples possibilidade de sofrer...transformámos-lhe o sofrimento...no seu quotidiano.
Em salões dourados a "ouro"...magnânimos...gente importante assassina as nossas crianças...vive bem com isso...nenhum peso carregam...consciência não têm...poderão ser o poder...mas jamais terão a condição de ser humanos.
Fica por ora esta foto...a lembrança dos sons dos seus sorrisos e a ilusão que ali...naquele momento...registado...o mundo era belo...o centro do mundo.
Estas não trazem gadgets ou equipamentos castradores da sua liberdade...não que os não tenham...não conheço a sua condição social...mas sinto...pelo som do "um-dó-li-tá" e dos seus sorrisos...que são...neste momento...livres das criações dos adultos que sonham sempre em encarcerá-las...seja de que forma for.
O que me corrói por dentro...qual ácido a deslizar suavemente pelas minhas veias...é pensar que estas crianças são...no exacto momento em que primo o botão do obturador...abençoadas pela sorte...são a excepção...são mesmo uma minoria.
Os seus direitos...consagrado numa carta bafienta e sem sentido prático...escrita por adultos...são na realidade a prova de que estas crianças são uma miragem...num mundo cada vez mais insuportável...
Perguntas em catadupa caiem com estrondo na minha cabeça...como é possível alguém roubar-lhes a inocência? Como é possível estas crianças serem uma excepção? Como é possível escravizar crianças? Como é possível transformá-las em objectos de rentabilidade laboral? Como é possível despejar-lhes bombas em cima? Como é possível dispor delas, na exacta medida em que se dispõe de um bem utilitário...sem valor? Como é possível retirar-lhes o sorriso...porque não têm sequer o direito a sorrir? Como é possível matá-las...conscientemente?
COMO É POSSÍVEL?
Mas se o estrondo das perguntas causa moça...o rasgo é letal quando sinto que todos os pontos de exclamação o não são...eles são pontos finais...não são nenhuma pergunta...são factos concretos.
Respirar a nossa própria impotência só é suportável ante o egoísmo sentido de nos darmos ao luxo de sofrer pelo que vemos...a muitas das crianças do mundo já tirámos nós a simples possibilidade de sofrer...transformámos-lhe o sofrimento...no seu quotidiano.
Em salões dourados a "ouro"...magnânimos...gente importante assassina as nossas crianças...vive bem com isso...nenhum peso carregam...consciência não têm...poderão ser o poder...mas jamais terão a condição de ser humanos.
Fica por ora esta foto...a lembrança dos sons dos seus sorrisos e a ilusão que ali...naquele momento...registado...o mundo era belo...o centro do mundo.
sexta-feira, 2 de março de 2018
o "velho e o rio" (sem mar)
Vinha suave numa tarde quente...sentia-se a paz e a cada remada o barco respondia num deslizar tranquilo.
A arte da navegação morava ali.
Uma coordenação de movimentos sublime...pausada e afinada...de tal forma que distorcia a real dureza da tarefa.
Seguia em direcção ao porto de abrigo...ali haveria de permanecer ancorado...embalado pela doce ondulação.
O patamar da experiência do marinheiro...já estava claramente ultrapassado. A fusão do homem com o barco...era perceptível...sentia-se...o barco era a sua extensão material...um só em navegação.
Não sei de onde vinham...sei que iam ancorar...mas tenho a certeza que não seria a última viagem...a sua chegada não soava a despedida...pelo contrário...rotina talvez.
Este marinheiro...que tem a dureza do seu tempo bem cravado na pele...não vive sem navegação...poderá ser uma relação de amor ou ódio...mas o rio corre-lhe nas entranhas e ele pertence às entranhas do rio.
Era um final de tarde quente...que este marinheiro refrescou...construindo um doce quadro com a sua presença...
A arte da navegação morava ali.
Uma coordenação de movimentos sublime...pausada e afinada...de tal forma que distorcia a real dureza da tarefa.
Seguia em direcção ao porto de abrigo...ali haveria de permanecer ancorado...embalado pela doce ondulação.
O patamar da experiência do marinheiro...já estava claramente ultrapassado. A fusão do homem com o barco...era perceptível...sentia-se...o barco era a sua extensão material...um só em navegação.
Não sei de onde vinham...sei que iam ancorar...mas tenho a certeza que não seria a última viagem...a sua chegada não soava a despedida...pelo contrário...rotina talvez.
Este marinheiro...que tem a dureza do seu tempo bem cravado na pele...não vive sem navegação...poderá ser uma relação de amor ou ódio...mas o rio corre-lhe nas entranhas e ele pertence às entranhas do rio.
Era um final de tarde quente...que este marinheiro refrescou...construindo um doce quadro com a sua presença...
quinta-feira, 1 de março de 2018
Sinais de um tempo...de agora
São sinais de um tempo propositadamente enganador...preocupante...e...em certa medida...sufocante.
Sou de um geração que "inaugurou" os parques infantis.
Os parques infantis de então representavam uma enorme conquista...tinham tanta coisa associada...eram o resultado de lutas violentas nas sociedades mais desenvolvidas.
Os "velhos"...os desses tempos...e não os da fotografia...também se sentavam nos bancos de jardim...rejuvenesciam com o som dos risos e das brincadeiras das crianças...que se divertiam e cresciam...nos parques infantis...que eles "velhos"...haviam criado.
Mas o mundo ocidental mudou e continua a mudar...a uma velocidade vertiginosa.
Em simultâneo construíram-se muros...que nos impedem de ver para lá deles...e o que vemos é o resultado de inúmeros filtros...muitos dos quais desconhecemos a orientação...a tonalidade...a granularidade...e ainda menos os seus criadores.
Hoje há o "nós" e o "eles"...o espírito comunitário foi totalmente absorvido pelo ideal do individualismo...apenas há lugar ao conceito de comunidade quando tal se traduz em lucro...negócio...com os acumuladores do costume...elites...muitas sem rosto...detentoras dos poderes formal e informal.
Dentro dos muros a população envelhece...as máquinas reproduzem-se...as crianças não nascem...ninguém quer saber.
O futuro é o agora...o já...o umbigo de cada um...neste preciso momento.
Este registo fotográfico é um registo trágico...mas não tem sangue à vista...aponta para um futuro cheio de convulsões...incertezas...medos.
A visão de um parque infantil...sem esperança....
Sou de um geração que "inaugurou" os parques infantis.
Os parques infantis de então representavam uma enorme conquista...tinham tanta coisa associada...eram o resultado de lutas violentas nas sociedades mais desenvolvidas.
Os "velhos"...os desses tempos...e não os da fotografia...também se sentavam nos bancos de jardim...rejuvenesciam com o som dos risos e das brincadeiras das crianças...que se divertiam e cresciam...nos parques infantis...que eles "velhos"...haviam criado.
Mas o mundo ocidental mudou e continua a mudar...a uma velocidade vertiginosa.
Em simultâneo construíram-se muros...que nos impedem de ver para lá deles...e o que vemos é o resultado de inúmeros filtros...muitos dos quais desconhecemos a orientação...a tonalidade...a granularidade...e ainda menos os seus criadores.
Hoje há o "nós" e o "eles"...o espírito comunitário foi totalmente absorvido pelo ideal do individualismo...apenas há lugar ao conceito de comunidade quando tal se traduz em lucro...negócio...com os acumuladores do costume...elites...muitas sem rosto...detentoras dos poderes formal e informal.
Dentro dos muros a população envelhece...as máquinas reproduzem-se...as crianças não nascem...ninguém quer saber.
O futuro é o agora...o já...o umbigo de cada um...neste preciso momento.
Este registo fotográfico é um registo trágico...mas não tem sangue à vista...aponta para um futuro cheio de convulsões...incertezas...medos.
A visão de um parque infantil...sem esperança....
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