quarta-feira, 16 de maio de 2018

Arte e ciência caminham de mãos dadas com a simplicidade...

Momentos simples que expressam tanto.

As vestes humildes...o local...as personagens que compõem o contexto...contrastam (à luz de preconceitos instituídos e amplamente difundidos) com a exigência da arte que está disposta no tabuleiro e que se assume como o centro do mundo...naquele momento.

Não estão a jogar um jogo, porque neste tabuleiro a sorte não entra...a sorte não determina e a única determinação é a de que a sorte não existe aqui.
Aqui, a estratégia e a táctica...elementos exigentes e que se alimentam, em exclusivo, do intelecto...aniquilam a emoção, a irracionalidade e até a crença no destino.

É certo que José Capablanca não vestia tais vestes quando em torneios, mas nas suas veias corria sangue cubano, como este, e a sua língua mãe era o xadrez.

A verdade...por mais que custe a assumir...é que não joga xadrez quem quer e não é menos verdade que é mais fácil e cómodo viver da sorte do que tomar em mãos o próprio "destino".

O preço a pagar pelo expurgo da sorte é sempre mais alto.

E assim fico...deliciado...a recordar este momento simples...registado de igual forma...simplesmente.

quarta-feira, 9 de maio de 2018

Trouxe-vos comigo...


Vocês não me conhecem…eu vi-vos na rua…e não resisti…registei-vos…trouxe-vos comigo.

Disseram-me que vocês eram pobres…mas eu sinto-me afortunado porque vos ouvi…porque vos trouxe.

Deixem-me fazer-vos uma confidência…eu tenho inveja do vosso sorriso…da vossa simplicidade…alguns acham que sou louco por invejar-vos…mas eu sinto-me bem a olhar para vocês.

Estavam a falar de política…diziam que a revolução vos tinha devolvido a dignidade…eu acho-vos dignos. Aqui pelas minhas bandas troçam da vossa roupa…mas eu acho que eles simplesmente não conseguem ver mais do que a embalagem…nós ligamos muito à embalagem…aos adereços…ao custo dos adereços.

Sabem…vocês confundem muita gente…falam de política…usam termos caros…e têm gostos de gente rica…fumam charuto…e têm poses de estadistas. Vocês parecem felizes…tranquilos…afáveis…isso desacredita o que dizem de vós…vocês destroem preconceitos e arrasam conceitos que por aqui se vendem como verdades absolutas…simplesmente por serem assim…simples e dignos.

A vossa terra é a terra dos contrastes…e eu adoro contrastes…gosto de ver o vosso tudo…perceber o vossa nada…sim, porque o vossa nada tem muito de mesquinho…tem muita maldade de gente medíocre.

Ainda bem que vos trouxe comigo…espero que não se aborreçam por causa disso…eu não vos conheço…não vos trato por tu…não trocámos uma palavra…tenho pena que não tenho sido possível.

Já tinha ouvido histórias vossas…gostei de vos ver…e por isso vos trouxe.

Deixo-vos a saudade…a minha saudade…e agradeço porque me enriqueceram a alma…aliás…que outras riquezas importam verdadeiramente?

quarta-feira, 2 de maio de 2018

Grande e nobre é sempre viver simplesmente...

Muito já foi escrito sobre Cuba e sobre os cubanos. Linhas escritas que destilaram ódios ideológicos em igual proporção às linhas que expressaram amor eterno pela utopia e pelo admirável mundo novo.

A propaganda, de uns e de outros, lançaram Cuba nos extremos…do encanto ao desaire…da maravilha à destruição total…da abundância à fome…da felicidade à agonia silenciosa.

Contam-se histórias, umas verdadeiras e outras nem por isso, de heróis a vilões tudo tem o seu espaço. A verdade de uns sempre foi a mentira de outros e vice-versa…e também aqui, como em tudo, Cuba permaneceu e permanece ainda hoje nos extremos…o tudo e o nada.

Fujo, por opção, que apenas a mim me diz respeito, da classificação ideológica que lhe dou e do posicionamento ideológico que julgo mais adequado à realidade que tive o privilegio de conhecer.

Confirmo sem pudor que Cuba, mais concretamente Havana, está em todos os extremos que conheço.
E esses extremos tocam-se…fundem-se…de tal forma que rapidamente perdemos a noção de onde começam uns e terminam outros. Somos envolvidos num carrossel em velocidade vertiginosa…projectando sobre nós sentires e sensações em catadupa…voltas e voltas inebriantes e encantadores…contrastes de luz e cor a brotar por todos os poros citadinos…e tudo isto embalado por um povo apaixonante…humilde…honesto e que, de forma ímpar, nos verga com a força do seu acolhimento caloroso.
 
As sonoridades trespassam-nos o corpo que, sem o nosso consentimento, agita-se e tende a flutuar, mesmo que de forma desconcertada.

Não há como não nos envolvermos por um povo que luta pela sua sobrevivência, não desiste e não sucumbe. Não há como não admirar a nobreza da humildade que não descamba no processo violento e criminoso. Não é possível não ceder sentimentalmente perante as ações permanentes e concretas de cuidados e preocupações que se sentem genuínas.

Olhares que trazem ternura, olhares que nos prendem, olhares que somos obrigados a enaltecer e tantas vezes nos fazem sentir inferiores perante tamanha lição de humildade.
A pobreza existente não se esconde e não foge dos olhares estranhos. Ela existe e é assumida com honra. Ela não é justificativa para ações de agressividade, mas ela projeta a sua revolta num acolhimento gentil e quente.

Havana dá-nos muito mais que os CUCs que lá possamos deixar (mesmo que muitos o neguem)…Havana é, para quem a quer conhecer pelas entranhas…de um encanto incomparável…

Bethânia cantou Pessoa “Grande e nobre é sempre viver simplesmente”…e como se projectam os cubanos neste cantar de uma poesia superior.